sábado, 9 de fevereiro de 2013

E._10.º_n.º 1








Sinfonia Para Uma Noite e Alguns Cães


De noite, um cão começa a ladrar; e,
atrás dele, todos os cães da noite
se põem a ladrar. Depois, o primeiro
cão cala-se. Pouco a pouco, os outros
também se calam, até que o silêncio
se instala, como antes de o primeiro
cão ter ladrado. De noite, não é
possível saber por que é que um cão ladra,
se o não estamos a ver. Talvez porque
alguém tenha passado por trás de um
muro; talvez por causa de um gato (essas
sombras que se esgueiram pelas portas).
Não é preciso encontrar razões concretas
para justificar a noite de todos os
cães; mas é verdade que um cão, quando
ladra, e acorda os outros cães, acorda
a própria noite, os seus fantasmas, e
obriga-nos a olhar, pela janela, o que
não se pode ver, isto é, o centro da
noite, o negro motor do mundo.

Nuno Júdice, Teoria Geral do Sentimento



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